26 de jan. de 2011

Transmissão do HIV e sua Tipificação Penal


Tema sugerido por Hernani Guimarães.

Como se tipifica a conduta de alguém que, tendo consciência que está contaminado pelo vírus HIV, mantém relação sexual com outrem sem preservativo?
Durante muito tempo a doutrina e a jurisprudência brasileira tipificavam a conduta como tentativa de homicídio (art. 121 c/c art.14, II), no caso da vítima sobreviver, uma vez que a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida era uma doença de consequência fatal, e assim o agente era movido pelo menos por dolo eventual. Mas, com o passar do tempo, e com o desenvolvimento de pesquisas na área, a AIDS deixou de ser uma doença de desfecho “morte” necessário, e passou a ser uma doença crônica, onde o portador do vírus, apesar de restrições poderá viver muito tempo.
Desta maneira, alguns doutrinadores, a exemplo de Mirabete, passaram a lecionar que a prática de relações sexuais daqueles que tem AIDS com alguém saudável, com o fim de transmitir a doença, se não contaminar será o art. 131 (perigo de Contágio de Moléstia Grave), se contaminar será homicídio tentado ou consumado ou lesão corporal de natureza grave (art. 129, §2º, II). Já Bitencourt entende que haverá o art. 131, mesmo que haja a contaminação, configurando lesão corporal tão somente se houver o enquadramento em lesão corporal gravíssima ( art. 129,§2º)
Ousando destoar um pouco dos renomados doutrinadores, entendemos que se há intenção de matar, independente do meio empregado, se este não for ineficaz, configurando assim crime impossível, não importa se houve ou não consumação, será sempre o art. 121, consumado ou tentado. Agora, se não há o animus necandi, aí sim, podemos separar os momentos, e os crimes: se contaminar lesão gravíssima, e se não contaminar art. 131.
O HC 98.712 do STF trata de um caso onde o paciente contaminou duas mulheres com o vírus HIV após ter relações sexuais consentidas, mas sem que elas soubessem da sua condição de soro positivo, e tentou contaminar uma terceira. O relator Ministro Marco Aurélio votou pela desclassificação do delito do qual o paciente é acusado, do art. 121 para o art. 131 do Código Penal, voto que foi seguido pelos demais ministros.
Entendemos, no entanto, que o delito merecia a desclassificação, mas não para o art. 131, uma vez que o entendimento majoritário é que caso haja o contágio o delito deixa de ser o art. 131 e passa a ser o art. 129 ( em sentido contrário Bitencourt, que entende que a contaminação é mero exaurimento, salvo se for gravíssima), e neste caso o art. 129, §2º, II, por ser doença incurável.
Assim resumo o nosso entendimento quanto a transmissão dolosa do vírus HIV por seu portador: Caso haja o ato capaz de transmitir a doença, mas não ocorra a contaminação haverá o crime de perigo de contágio de moléstia grave, caso haja contaminação haverá lesão corporal gravíssima, e se advier a morte estaremos diante de lesão corporal seguida de morte, mas, em qualquer caso, se a intenção do agente for matar a sua vítima haverá homicídio, em ocorrendo o sinistro teremos crime consumado, caso a vítima sobreviva haverá tentativa de homicídio.

Referências:
HC 98.712- STF. VOTO Ministro Marco Aurélio. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/hc98712MA.pdf. Acesso em 26 jan 2011.
MIRABETE, Julio F.; FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Parte Especial. Vol 2. São Pualo: Atlas, 2010.
BITENCOURT, Cezar R. Tratado de Direito Penal. Parte Especial. Dos crimes contra a pessoa. São Paulo: Saraiva,2007.

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