4 de mar. de 2012

Reflexões sobre o crime de Assédio Sexual

A redação do art 216-A, estabelecida pela lei 10.224 de 15 de maio de 2001, recebe por parte da doutrina severas críticas, chegando o professor Ney Moura Teles a afirmar que

Mais uma vez o legislador brasileiro trabalhou mal. Buscado conferir proteção à liberdade sexual das pessoas contra comportamentos indignos realizados no dia-a-dia do trabalho e em outras relações interpessoais, a norma não satisfaz aos interesses da sociedade, dada a sua imprecisão técnica.[i]
Bitencourt relaciona uma série de argumentos sobre a   inconveniência da adoção desta figura penal pela legislação pátria, a discussão sobre estes argumentos será abordada em tópico específico.
Mas o primeiro problema que se apresenta é a determinação do alcance do verbo que define a ação nuclear do tipo. O verbo “constranger” quando utilizado nas demais figuras típicas do código penal, é bitransitivo tendo sempre o significado de obrigar, forçar, compelir, e vem acompanhado do necessário complemento, quem obriga, obriga alguém a fazer alguma coisa, quem compele, compele alguém a fazer alguma coisa, e mais, o verbo vem acompanhado do modo como o constrangimento se dará, ora através de grave ameaça, ora através de violência: conforme se pode observar nos crimes de constrangimento ilegal ( art. 147), extorsão (art. 158), estupro (art.213)[ii].
A redação do preceito primário do artigo 216-A é a seguinte: Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.
Observa-se de logo, que “obter vantagem ou favorecimento sexual” é a finalidade que o sujeito ativo quer alcançar e não algo que o mesmo queira obter por meio da força, ou através de grave ameaça, até porque se assim ocorrer estar-se-á diante do crime de estupro (art.213) ou do crime de atentado violento ao pudor (art. 214). Não há a previsão do modo como se dará este constrangimento, nem qual o comportamento que o sujeito ativo estará obrigado a fazer, não fazer ou tolerar.
Diante desta constatação, o verbo constranger, diferentemente de como foi utilizado nos demais dispositivos do Código Penal, tem, no art. 216-A, o significado de incomodar, embaraçar a vítima, e até mesmo humilhar. Mirabete encontra, ainda, para este verbo, dois outros significados: tolher a liberdade e cercear[iii], mas diante deles dever-se-á tomar um cuidado redobrado para que não seja feita confusão com outras figuras do Código penal como seqüestro e cárcere privado para fim libidinoso ( art. 148, §, V) e constrangimento ilegal.
Bitencourt, prudentemente, verifica que “Tratando-se de crime de ‘assédio sexual’, seria natural esperar que a conduta do eventual agente desse crime fosse representada pelo verbo ‘assediar’, que no idioma pátrio, tem o significado de ‘perseguir com insistência’”.[iv]
A vontade do legislador em aproximar o crime de Assedio Sexual dos demais crimes contra os costumes, que utilizam o verbo constranger como definidor de suas ações nucleares, trouxe para a redação do mesmo a imprecisão do alcance do verbo e conseqüentemente dificuldade de adequação dos comportamentos em concreto à figura abstramente prevista.
A tipificação das condutas, portanto gera uma discussão de grande importância. Assim, se não se determinar de forma bastante precisa o que seria constranger alguém para os fins do crime de Assédio Sexual, ter-se-ia a possibilidade de gerar grandes problemas práticos, pois atos e palavras podem ser interpretados de formas bastantes diferentes por quem os realiza e por seus destinatários. Além de alguns tipos de assédio, realizados de forma velada, mas com a firme intenção de assediar poderem ser interpretado de forma diferente do que traduz o verdo constranger.
A boa norma penal é aquela que é clara e não deixa margem a variações, neste aspecto muito peca a redação do crime em análise.


[i] TELES, N. M. Direito penal: parte especial. Vol III. São Paulo: Atlas, 2004. p.84.
[ii] Todos os artigos citados são do código penal brasileiro.
[iii] MIRABETE, J. F. Manual de direito penal. V.II. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.430.
[iv] BITENCOURT, C. R.. Tratado de direito penal. Parte especial. Vol 4. São Paulo: Editora Saraiva:, 2004. p. 34

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