“Professora, qual a sua
opinião sobre este caso que saiu no jornal?”, esta frase é corriqueira em minha
sala de aula, até porque discutimos Direito Penal e, este ramo do Direito,
permeia o dia a dia de nossos alunos, seja pelos programas de televisão, seja
pelo receio sempre constante de ser vítima de algum crime. E quando algum caso
de maior repercussão acontece, o burburinho da sala de aula chega até o
professor.
Não me furto a estas
conversas, mas, via de regra, meus alunos não obtém a resposta esperada, pois começo
a conversar usando o condicional ou expressando meu espanto: “Se aconteceu,
como estão noticiando, então houve...”, “Espanta-me a rapidez com que apontaram
a autoria...”, “E se as coisas não são exatamente como estão noticiando...”.
Romper a barreira do que meus alunos trazem como verdade, adquiridas por meio
do “disse me disse” não é fácil, e olhares de desconfiança são lançados sem dó
para esta professora. É então que lembro de Larrosa, professor e filósofo
espanhol que discute como é difícil, nesse nosso tempo, sairmos do campo da
informação e avançarmos para a experiência.
A informação é amorfa, vem de
todas as regiões e tem pouco compromisso com a verdade. Já a experiência é
aquilo que nos passa, que nos toca. Não apenas o que acontece, mas o que nos
acontece. E segundo Larrosa, a experiência está cada vez mais difícil,
inclusive, entende ele que as informações, em regra, são produzidas para não
gerarem experiência. E seriam quatro os empecilhos: o excesso de informação, o
excesso de opinião, a falta de tempo e o excesso de trabalho.
Aliás, quanto ao excesso de
informação, além de não propiciar a experiência, é uma antiexperiência, uma vez
que este excesso impede a conexão significativa entre os acontecimentos. O
saber da experiência não é o saber das coisas, não é estar informado, mas é
permitir que a informação aconteça no sujeito. Apenas saber e não permitir que
a informação toque o sujeito não é experimentar, e neste sentido Larrosa Bondía
(2002, p. 22) conclui que " [...]uma sociedade constituída sob o signo da
informação é uma sociedade na qual a experiência é impossível."
E o aluno de direito tendo
acesso a um grande número de dados, normalmente em formato de verbete de
enciclopédia, tem a impressão de estar habilitado a opinar sobre tudo, a formar
opinião sobre aquilo que acredita estar informado. Não é raro os meus alunos de
direito terem dificuldade, por exemplo, de compreenderem conceitos como dolo e
culpa, refletirem sobre os princípios de Direito Penal, entre outros assuntos
que trazem teorias que estão na contramão do senso comum, porque eles entram em sala de aula com excesso
de julgamento, uma vez que a formação de uma opinião gera um apego que impede
que algo aconteça no aluno, que a experiência o toque.

E, associado à falta de tempo, há o excesso de
trabalho. Os alunos, professores e profissionais do direito são instados a tentar
mudar o mundo em uma visão otimista de que tudo pode realizar, e relacionar-se
com mundo do ponto de vista da ação, mais uma vez não sobra tempo para o silêncio,
porque sempre está em busca do fazer, de preencher o seu currículo, de mudar o
mundo.
Neste ponto lembro de livro
de Mário Quintana, que tem como título “Da preguiça como método de trabalho”,
em que o poeta nos diz, em sua crônica inicial que a preguiça é a mãe do
progresso. A experiência que se faz no
meio do turbilhão de atividades do nosso dia a dia é mínima, porque não temos
tempo que permita a reflexão. A aquisição da experiência necessita do silêncio
interior, do silêncio que permite a reflexão, a ponderação crítica, é preciso,
como nos ensina Larrosa:
[...] requer parar para
pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais
devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar,
demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a
vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza,
abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a
lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter
paciência e dar-se tempo e espaço. (LARROSA BONDIA, 2002, p. 24)
É esta experiência que pode
se tornar um conhecimento. Todavia, os alunos não estão tendo esta experiência,
talvez porque os próprios professores não permitam eles experimentar, refletir,
deixar a informação tocá-los. Muito mais do que ser um cabedal de muitas
teorias jurídicas, nossos alunos precisam compreender seus fundamentos e o
momento histórico em que elas foram forjadas. Não raro vejo críticas às teorias
positivistas como se seus autores as estivessem forjado em meio ao pensamento
atual, e não em um momento que fazia todo sentido o pensamento lombrosiano, por
exemplo.
A proposta então é simples: Vamos
parar um pouco, obter as informações, silenciar, refletir. Não vamos ser meros
repetidores de teorias ou massa de manipulação. Somos chamados a pensar além da
informação, somos chamados a experimentar.
Nota: Quem quiser ler o
Larrosa pode encontrar o texto que discute experiência no endereço: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf
Publicado originalmente em: http://www.parlatoriojuridico.com.br/parlatoriojuridico/pagina/48